29/04/2009


As luzes da Ribalta

 

 

 as luzes da ribalta

acendem-se na meia noite escura

iluminando a face oculta do dia

espalhando fogueiras de alegria

anunciando vestes de cortesia

 

acordem-se os actores!

a festa vai começar

levantem-se os espectadores

a noite já vai reinar

colocar vestes de rainha

 

majestosa, triunfante e vadia

vai desenhando um perfil elegante

caminha majestosa e sozinha

subindo no mais alto do pilar

atravessa a plateia a declamar

de côr e luz a rebentar

num fogo cruzado deslumbrante

e a lua cheia a chamar

 

estrelas em sintonia

brilhando na terra e no céu

numa enorme euforia

levantam a ponta do véu

numa mágica folia

estende-se a capa do tempo

com fumo e perfume a pairar

 

corpos nus a transpirar

risos com lágrimas e rubor

horas de grande clamor

 

e por fim

no meio de tanto motim

é a madrugada a chegar

e a festa vai acabar

 

a noite cansada vai alta 

apagam-se as luzes da ribalta.

 

 (1975)



Limite

 Acordei

quando os meus olhos encontraram os teus

e o meu pensamento percorreu o teu

      não sei...

talvez não fosse...

mas eu queria... e

inventei horas que compartilhei contigo

interrompi instantes que vivia

saindo da confusão constante

para cair pesadamente, no abandono,

da estranha e mórbida apatia

como se fora mesmo o sono...

a luta do inconsciente

a razão adormecida

na outra face da vida

jogando fora o presente

     brincando

 entre ti e mim

numa distância ilimitada

nesse espaço gigante

onde continuava a vida

onde existia gente

caminhando ininterruptamente,

quebrando, bruscamente,

o meu longínquo e breve “presente”

que partiu

no instante em que surgiu.

(1977)




 

                         Renovação

 

 

Nunca te vi...

Sei lá quem és(?)

Achei-te, casualmente, num Quadro da Vida

Como quem acha “coisa” jamais conseguida

Assim como “matéria” que se agarra e se não tem

que tanto, tanto se quer e nunca a nós vem.

Achei-te, num belo Quadro,

Numa encantadora parcela da Vida

Com luzes fulminando nossas mentes,

Pesadas, obstruídas de desejos ardentes

     E milhões de estrelas a cintilar

Respirando-se a essência da brisa do mar

     E o meu desejo distante e mórbido

Que, achando-se em fogo,

     Nas águas frias ficou a nadar...

Nele encontrei as forças vivas da natureza

E a intensa renovação do meu “ego” adormecido,

Embalado na superfície das águas turbulentas

E a minha alma divagando ao sabor da água morna,

     Na noite calma, de silêncio e de sorna,

Em que a gente, a ver o mar se queda, cismando,

Nas coisas que a vida nos traz e torna a levar,

Sem força para continuar caminhando

E no desejo de aí para sempre ficar

À procura, na confusão do elevado pensamento humano,

Daquela ternura imprescindivelmente necessária

Que nunca pára no meio mundano

                 E quando pára, é somente temporária.

Senti colado ao meu, o teu corpo, a transpirar

E vi os teus olhos verdes, côr do mar, querendo falar

E as tuas mãos, ao de leve, penetrando

     Na breve eternidade da palavra “amar”

Que agarra a gente com força

Atirando-nos para o precipício da “evasão”

E nos liberta da sufocante solidão.

Porque, se o mundo é a força brutal

Onde nunca nos encontramos a par da razão,

     Tu, fazendo parte dele,

                 És, para mim, sinónimo de “Renovação”.

 


 (02.09.73)

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