Vazio
Fim de tarde
princípio de noite
pensamentos em turbilhão
num acréscimo de confusão
duma amálgama de sentimentos
foi o dia
vem a noite
sopram leves e brandos os ventos
impera o silêncio e a calma
na escuridão
do vazio da minha alma
sinto fome
sinto sede
os campos são frescos e estão verdes
quero sentir tocar e olhar
os teus olhos brilham entre os verdes
só de olhá-los sinto sede
aflui-me nas veias o sangue sem parar
persiste forte o desejo de te amar
fecho os olhos levemente
caminho em sonhos tranquilos, docemente
transporto-me nas águas paradas
dos relvados imensos do infinito
nas paragens distantes do longínquo
na beleza entontecida
da natureza adormecida
a saudade que morre no além
a dor que nasce em alguém
é toda uma vida a girar
sem sentido sem destino
sem forma sem conteúdo
sem ter nada para dar
dentro de mim o nada é tudo.
1982
***
Ausência
Lá em baixo, leve espuma, branca e fria, saltando na rocha, saltando na praia. As ondas, cambaleantes, na areia macia… oh, doce maresia, doce melancolia! Doce palpitar do mar, suave… beleza, pureza… virgindade pura, virgindade natura!…
Lá em baixo, leve redemoinhar da espuma branca, serpenteando na areia, na água velada e transparente, beijando a praia, tragando a areia. Saboreando, infinita, a imorredoura glória de ser “verdade”, de ser “ventura”, de ser “loucura”.
Na praia, caminhando na inconsciência, há sombras contrastantes, que caminham taciturnas, jogando fora a réstea duma feliz hora, desse tempo perdido da lonjura, na esperança de a própria esperança encontrar.
Lá em baixo, vogando nas águas, há risos de crianças e de homens, que até lá chegam ecoando, tão distantes e profundos, tão sinceros e tão ardentes!…
Lá em baixo, à superfície calmosa, ao calor da fria água, gelam palavras fragrosas e ardem palavras sinceras.
Há sombras de gentes inumanas, bailando, irreconhecíveis, que nada dizem, que nada são.
Lá em baixo, é tarde morna, nunca há noite nem manhã, nunca se morre nem se nasce… tudo permanece inalterável, crendo em tudo, esperando em nada.
Set.1971
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